sabes durante quantos anos foram cerca de 1.300 tratados assinados? durante tantos anos quantos os anos de chacina por que nos fizeste passar que tratado houve que os brancos tenham respeitado e o índio tenha rompido? nenhum onde estão hoje os nossos guerreiros? quem os terá chacinado? e onde estão as nossas terras? quem será que as possui? que homem branco poderá mostrar que eu alguma vez lhe tenha roubado a terra ou um tostão que fosse do seu dinheiro? e dizem, apesar disso, que sou ladrão que mulher branca, mesmo sozinha, foi alguma vez feita cativa ou insultada por mim? e dizem, apesar disso, que sou mau índio que homem branco me terá alguma vez visto bêbado? quem é que alguma vez terá chegado ao pé de mim com fome e tenha partido em jejum? e alguém me terá alguma vez visto bater nas minhas mulheres e enganar os meus filhos? que lei terei eu quebrado? não terei eu razão por ser fiel à minha própria lei? será da minha parte um mal que tenha pele vermelha? que tenha nascido onde o meu pai viveu? que morra pelo meu povo e pela minha terra? conheci a vida quando o vento soprava livre onde não havia cercas, onde nada enfraquecia a luz do sol cresci entre os riachos e os rios onde o peixe brilhava e dançava ao sol quando as florestas me davam de comer e do que precisava para me vestir onde tudo respirava livremente e o meu espírito, como os ventos, vagueava então pelas tuas boas terras. terra, beleza singular que depositou em mim o seu sorriso e me fez feliz terra, mãe sagrada as árvores e toda a natureza são testemunhos dos teus pensamentos e das tuas acções os pássaros que voam nos ares vêem a ela repousar terra, lugar permanente de todas as coisas que vivem e crescem a terra suaviza, fortifica, lava e cura é por isso que me afinco a ela em vez de me separar das forças da vida sentar-me ou deitar-me na terra significa poder pensar mais profundamente e sentir com mais intensidade; contemplar os mistérios da vida com mais clareza e sentir mais próximas as forças vivas que me envolvem. a relação que mantenho com todas as criaturas da terra do céu e da água, é um princípio real e activo é muito estreita a familiaridade com os meus amigos de penas ou pele: é como se fossemos irmãos, falamos a mesma linguagem e eles retribuem com confiança na minha terra, no meu tipi, sento-me no chão e medito na vida e no sentido que ela tem. aceito o parentesco com todas as criaturas e reconhecendo a unidade das coisas no universo instalo no meu ser a verdadeira essência da civiçização: estamos todos ligados, eu e a terra somos um só. sou um amante da natureza amo a terra e todas as coisas da terra e esse afecto cresce dentro de mim com a idade sei que o coração do homem afastado da natureza endurece; a falta de respeito por aquilo que cresce e vive leva rapidamente à falta de respeito pelos seres humanos. por isso mantemos os nossos jovens sob a mansa influência da natureza. às vezes surgem homens com um dom para fazer coisas extraordinárias. mas nunca houve ninguém que pudesse dirigir o sol, a terra o ar e a água. vejo claramente a diferença profunda que existe entre a vossa e a minha condição não tens a liberdade de fazer o que te vai no espírito tens medo dos ladrões, das falsas testemunhas, dos assassinos. és movido por normas e convenções, como o gelo flutuante que vai por aqui e por ali levado pela corrente. estás na dependência duma infinidade de pessoas e outras tantas dependem de ti. isso leva-te a um desequilíbrio profundo. é isto, verdade ou não? sou senhor da minha condição eu sou senhor do meu próprio corpo, e disponho em absoluto de mim mesmo faço aquilo que me agrada sou o primeiro e o último da minha nação, não receio homem nenhum, e dependo apenas de wank tankã: o deus sol, terra, agua, e ar. o que é a vida? é o brilho do pirilampo na noite; é o sopro dum bisonte no Inverno; é a sombra que corre na areia, e se perde ao fim do dia. as cinzas dos nossos antepassados são sagradas para nós, e o sítio onde repousam é terra santificada o acampamento é imóvel o acampamento pertence ao primeiro que se senta na sua manta ou nas suas peles que lançou por terra até que deixe esse sítio ninguém mais a ele tem direito um dia o homem branco chegou à nossa terra e nestes longos anos, após a sua chegada, vi a minha felicidade desaparecer como salmão que misteriosamente se some no rio. não pode haver duas ocupações do mesmo lugar: a primeira exclui todas as outras. o mesmo não acontece quando se caça ou se viaja porque então o mesmo solo pode servir a muitos. a nossa gente estava à caça do bisonte para que as minhas mulheres e os meus filhos tivessem as faces cheias e o corpo quente. quando houve alvoroço na linha que nos separava, os meus jovens guerreiros dançaram a dança da guerra, mas o meu povo nunca foi o primeiro a lançar uma flecha ou a disparar uma arma de fogo contra os brancos: vós enviastes o primeiro soldado e nós enviámos o segundo. desde então houve um ruído como o da tempestade e ficámos sem saber que caminho tomar. os nossos direitos valem demais não são vencidos por palavreado nem trocados por ouro. as palavras mudam, o valor da moeda varia pode até deixar de existir mas a nossa terra não desaparecerá a nossa terra vale mais que dinheiro. há-de permanecer nem as chamas que o incêndio ateia a farão perecer. enquanto brilhar o sol a as águas correrem esta terra aqui estará, para dar vida aos homens e aos animais os tratados foram o meio de o homem branco legitimar aos olhos do mundo, a sua presença na nossa terra. representam um acordo sagrado e honroso entre nós próprios e o homem branco. e esse acordo não pode ser revogado unilateralmente pelos chefes brancos, à mercê de caprichos. os nossos chefes comprometiam-se a si mesmos ao seu povo e aos seus descendentes a honrar o que então ficara estabelecido. foi um equívoco. o nosso poder esvai-se. estamos a morrer, porque o poder já não está dentro de nós. basta ver os nossos rapazes para perceber o que se passa: quando vivíamos em paz na nossa terra, como devíamos, os rapazes eram homens feitos aos doze ou treze anos. agora, levam muito mais tempo a atingir essa maturidade as coisas são o que são. os homens brancos riam-se na cara dos índios, para ganharem confiança, e nos enganarem, apertavam-nos a mão. roubaram-nos, embriagaram-nos, iludiram-nos e arruinaram as nossas mulheres. disse-lhes para nos deixarem, que ficassem longe de nós, mas eles continuavam a seguir-nos, assaltavam os nossos acampamentos e insinuavam-se no meio de nós como cobras. voltamos então os olhos para o grande espírito. na floresta já não havia veados. o bisonte tinha desaparecido, o castor tinha fugido as fontes secaram. reunimos um grande conselho e todos nós falámos diante de uma fogueira. o ambiente era quente e agradável. o nosso espírito elevou-se e disse: vingais as afrontas ao vosso povo, ou deixai-vos morrer. fizemos ouvir os nossos gritos de combate e desenterrámos o machado de guerra, as nossas facas estavam prontas e o coração crescia no peito de todas os guerreiros. não podemos ceder os nossos direitos sem do mesmo passo nos anularmos. é por isso que sabemos que enquanto lutarmos pelos nossos direitos havemos de sobreviver; se nos rendemos morremos. os homens brancos eram muitos e nós não lhes podíamos fazer frente estávamos ali como alces, e eles como ursos-pardos as balas voavam pelo ar como pássaros, assobiavam aos nossos ouvidos tal como o vento no inverno, assobia nas árvores. os meus guerreiros tombavam ao meu redor o sol ergueu-se pálido sobre nós e, à noite, mergulhou numa nuvem escura parecendo uma bola de fogo. foi o último sol que vi brilhar. o meu coração está agora moribundo e jamais há-de bater rápido no peito. sou vosso prisioneiro, como todos os meus guerreiros. sinto um grande pesar, pois, ainda que vos não possa vencer, esperava mesmo assim, suportar mais tempo a luta e dar-vos mais trabalho antes de me prenderes. sou prisioneiro dos homens brancos fui torturado, mas não tenho medo de morrer. não sou cobarde. combati pelo meu povo contra os homens brancos, que nos enganavam e tomaram nossas terras. fomos expulsos, empurrados para a lama dum pântano sombrio, chacinados, culpados de uma só ofensa: a de possuirmos aquilo que o homem branco cobiçava. partimos tristes, de coração despedaçado. haveríamos, ainda assim, de ser livres… completamente perdidos caminhamos em silêncio por dentro da noite gelada. o silêncio é o grande mistério o silêncio sagrado é a sua voz e os seus frutos são: o auto domínio, a verdade coragem ou a resistência, a perseverança a dignidade e o respeito o silêncio é a pedra angular do carácter. o não dito pode constituir matéria de mútua compreensão ou pode ser algo que é indicado de maneira a só ser inteligível para quem se destina. eu sou uma sombra o meu povo está disperso, desapareceu quando eu grito ouço a minha voz perder-se na profundezas da floresta e não há voz que me dê resposta tudo em meu redor é silêncio têm pois as minhas palavras de ser poucas nada mais posso agora dizer condenaste-nos antes de nos compreender simplesmente porque o nosso culto é diferente do vosso quando me recordares tira proveito dos nossos ensinamentos se não fordes suficientemente humildes para o reconhecerdes, podeis estar certos de que, à destruição do índio seguir-se-á a destruição da natureza e a esta a vossa própria destruição. em suma, cavais a vossa própria sepultura. em certo sentido, soubemos desde sempre que o único futuro decente para vós reside na redescoberta do vosso meio ambiente precisais estabelecer uma relação legítima com a terra, e os seus recursos; só assim conseguireis viver em estado de equilíbrio ou, como dizem os cristãos, em estado de graça sem o castigo dos culpados sem a recompensa dos justos o homem branco tornar-se-á o mais miserável dos povos. o sofrimento do homem índio ao assistir à destruição do seu modo de vida nunca foi inteiramente compreendido pelo homem branco e talvez nunca o venha a ser nós, os índios, havemos de mostrar ao mundo como vivem os seres humanos. o vosso país um dia há-de rever a sua constituição e as suas leis pensando em seres humanos e não em propriedades a propriedade privada é o caminho conducente à pobreza e não à riqueza as nossas ideias hão-de vencer as vossas. havemos de por em frangalhos o sistema de valores do vosso país. não importa que hoje sejamos uma minoria o que importa é que temos um modo de vida superior o meu coração é uma pedra pesado pela tristeza que sinto pelo meu povo gelado pelo conhecimento de que nenhum tratado poderá manter os brancos fora das nossas terras firme pela determinação de resistir enquanto eu viva e respire. escutai-me porém: um galho isolado parte-se mas um feixe de galhos é robusto um dia hei-de abraçar os nossos irmãos de outras tribos e conseguir que façam um feixe e juntos haveremos de reconquistar a nossa terra aos brancos arrancaram-me da minha morada adoeci, e sinto-me a morrer como poderia ter sido simpático e dócil com aqueles que chacinaram a vida do meu povo? com lágrimas correndo, devo dizer agora: aqui me vedes, um velho deplorável, decaído e sem nada ter realizado. aqui, no centro do mundo, aonde me trouxestes quando era novo e onde me ensinaste, aqui estou, envelhecido. com mágoa lanço débil voz, para vos apelar pois por certo nunca mais o voltarei a fazer… fazei que o meu povo viva após gerações de incessante frustração a nossa gente está cansada e impaciente. nada mais vos peço, mas não esperamos menos que isto o meu culto o meu povo foram e continuam a ser ignorados nos livros de história mas nós havemos de ser sempre lembrados demos muitos nomes da nossa língua a muitas coisas belas as muitas luas e dias de sol que vivemos haverão de falar por nós todas as terras por onde andamos há-de brilhar a nossa imagem e hão-de murmurar as nossas mágoas hão-de sussurrar os nossos nomes ao sol que os beijas. podereis vós e os vossos filhos, ouvir esse cântico eterno sem se vos apertar o coração? quanto tempo ainda te falta para conseguires ouvir as palavras que trago no rosto? as cicatrizes que carrego a nu em meu corpo? e no meu olhar, o vazio de uma terra que guardarei sempre para mim? diz-me, quanto tempo ainda te falta? hoje sobrevivo entre o homem branco sem tempo no mundo entre as normas e as convenções entre o betão e a poluição entre o puder e o crime entre o jogo e a sedução mas a minha alma mantêm o espírito lakota vivo vivo no mundo sem tempo entre o puro e o autentico entre o único e o despido sou o que sou sou o que me fazem ser e como antes de ser ser, seja lá o que for é preciso sentir... é assim que sinto é assim que sou lakota qual será o valor supremo da vida humana? é esta a questão |
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